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*Artigo: Sueme Mori e Pedro Rodrigues
Os próximos dez anos para o agro mundial
A produção agropecuária mundial deve continuar crescendo nos próximos dez anos, mas a um ritmo inferior ao registrado na última década. Essa é uma das mensagens-chave do relatório divulgado no início desse mês pela Organização para a Cooperação e Desenvolvimento Econômico (OCDE) e pela Organização das Nações Unidas para a Alimentação e a Agricultura (FAO).
Publicado anualmente, o “OCDE-FAO Perspectivas Agropecuárias 2023-2032” traz projeções relacionadas a consumo, produção, comércio internacional e preços das principais commodities agropecuárias nos próximos dez anos.
O documento destaca o cenário de incerteza global, tendo em vista as tensões geopolíticas, os eventos climáticos extremos e a crescente volatilidade dos preços dos insumos. Por esses e outros motivos, OCDE e FAO preveem que a questão da segurança alimentar continuará como prioridade na agenda mundial.
As implicações da guerra entre Rússia e Ucrânia no mercado global de alimentos são citadas várias vezes no documento, destacando a importância da iniciativa que permitia o transporte, com segurança, de grãos produzidos pela Ucrânia. As previsões feitas no relatório consideraram a continuidade do “Acordo de Grãos no Mar Negro” como uma das premissas, o que deixou de ser verdade nesta semana com a recusa da Rússia em renovar sua participação. Autoridades e especialistas já alertam para os efeitos negativos que essa suspensão deve ter nos preços das commodities ao redor do mundo.
A interrupção desse Acordo torna ainda mais complexo o desafio de alimentar uma população que deve chegar a 8,6 bilhões de pessoas em 2032. Aliás, o crescimento populacional e a ampliação da renda per capita ainda devem seguir como as principais alavancas para o aumento previsto de 13% na demanda por produtos agropecuários para os próximos 10 anos.
Os países que devem registrar as maiores taxas de crescimento populacional são os de renda baixa, particularmente os da África subsaariana, onde a média anual de aumento deve chegar a 2,4%, bem superior à mundial de 0,8%, até 2032.
Já a Ásia continuará como a região que mais puxará o aumento da demanda mundial de alimentos. Esse protagonismo dos asiáticos está refletido nas exportações brasileiras do agronegócio destinadas a esse mercado, que entre 2013 e 2022 praticamente dobraram, partindo de uma base de US$ 40,9 bilhões para US$ 79,3 bilhões.
Preocupações relacionadas à saúde e ao meio ambiente também devem ser fatores determinantes, sobretudo em mercados como o da União Europeia. Um dos exemplos dessa tendência citado no relatório da OCDE-FAO é o Pacto Verde (Green Deal), estratégia europeia para alcançar a neutralidade climática até 2050, e do qual derivam uma série de regulamentos que impactam tanto a produção agropecuária do bloco quanto o comércio com outros países. Uma dessas medidas, a chamada Lei Antidesmatamento, impede a circulação e a entrada de produtos que tenham sido originados de áreas abertas após 2020, e cria uma série de exigências de cunho ambiental.
No lado da oferta mundial de alimentos, os maiores ganhos devem vir do aumento da produtividade e não da expansão das fronteiras agrícolas. A implementação de técnicas e tecnologias poupadoras de terras serão o principal motor para o incremento de 12,8% na produção global até 2032.
Países de regiões em desenvolvimento devem ser os principais contribuintes para essa expansão, enquanto mercados como o norte-americano devem registrar crescimento limitado. O Brasil é citado como um dos responsáveis por esse aumento da oferta mundial de alimentos. No caso dos grãos, por exemplo, a Conab estima que a safra nacional alcance 317,6 milhões de toneladas.
No comércio internacional também é esperado um crescimento mais lento em relação à última década. A China, importante player na importação de produtos agropecuários, deve começar a observar uma população decrescente e um crescimento econômico menos acelerado, levando a uma desaceleração das compras externas.
Mesmo com o forte impacto causado pela pandemia, o comércio de produtos agropecuários se mostrou bastante resiliente. Enquanto o comércio mundial caiu 12,8% entre 2019 e 2020, o de alimentos cresceu 1,9%, desconsiderando-se o comércio intrabloco da UE. Entretanto, o crescimento no comércio internacional de alimentos deve desacelerar. Entre 2013 e 2022 a média anual de crescimento foi de 2,94%, enquanto na próxima década deve figurar próximo a 1% ao ano.
Contudo há diferenças regionais significantes, sobretudo para a região da América Latina e Caribe, que deve ampliar seu papel em 17% nos próximos dez anos como exportadora líquida de alimentos. No Brasil, o crescimento das exportações líquidas deve alcançar 18%.
Assim como na publicação do ano passado, o texto destaca a importância do comércio internacional para garantir a segurança alimentar mundial, especialmente no caso de regiões em que a produção agropecuária é insuficiente para abastecer a população local, como acontece em diversos países do Oriente Médio e da Ásia.
O aumento do protecionismo e de medidas que restrinjam o fluxo de bens entre os países, especialmente insumos e alimentos, pesa negativamente na luta contra a insegurança alimentar, que é uma responsabilidade de todos, e não somente dos que sofrem com ela.
Sueme Mori é diretora de Relações Internacionais da Confederação da Agricultura e Pecuária do Brasil (CNA). Com a colaboração de Pedro Rodrigues, assessor de Relações Internacionais da CNA.
*Artigo publicado originalmente no Broadcast Agro
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